Moradores da Serra da Cantareira há mais de 50 anos, Mauro
Victor (à direita) e Luiz Bettarello
estão contra a construção do trecho Norte
do Rodoanel
Com Estudo de Impacto Ambiental paralelo, ambientalistas da
Serra da Cantareira pedem ao banco suspensão de financiamento.
Principal vitrine do PSDB nas eleições de 2012 e 2014 e
maior obra viária em execução no Brasil, o Rodoanel Mário Covas, em São Paulo,
corre o risco de perder parte significativa de seu financiamento graças à ação
de um "exército de Brancaleone" formado por ambientalistas da Serra
da Cantareira.
Liderados pelo engenheiro agrônomo Mauro Moraes Victor, que
foi um dos fundadores do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), e pelo
médico homeopata Luiz Bettarello, o grupo tem a retaguarda de 60 ONGs da
região.
Para impedir as obras do trecho Norte, que passa pela região
da Serra da Cantareira, na Zona Norte da capital paulista, eles recorreram ao
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) pedindo a suspensão do
financiamento de R$ 2 bilhões prometido pelo organismo ao governador Geraldo
Alckmin (PSDB).
Com conclusão prevista para o ano eleitoral de 2014, o
trecho Norte tem custo estimado de R$ 5,2 bilhões e deve ligar o Aeroporto
Internacional de Guarulhos com a Rodovia Fernão Dias. O trajeto ainda leva aos
trechos Oeste e Sul do Rodoanel, que estão em operação e ligam as Rodovias
Bandeirantes e Anchieta, facilitando o acesso a Santos.
Até agora, os ambientalistas venceram duas batalhas ao
apelar diretamente ao BID. "A primeira foi em 1987, quando a prefeitura
tentou construir uma avenida que cruzava o Parque da Cantareira; e a segunda,
em 2000, quando o Governo Federal tentou fazer o Rodoanel", diz Luiz
Bettarello, ao mostrar recortes de revistas e jornais que noticiam a suspensão
dos recursos do BID.
Nas últimas semanas, os ambientalistas conseguiram mais uma
vitória importante e que acendeu a luz amarela no governo estadual. O BID
instalou um painel de investigação para averiguar as denúncias apresentadas ao
banco no formato de Estudo de Impacto Ambiental paralelo. O documento foi feito
em inglês e tem 116 páginas.
"O BID aparece como parceiro nas propagandas do governo
paulista. Isso é propaganda enganosa", afirma Mauro Victor. Para ele,
enquanto a demanda do grupo não for julgada internamente no banco, os recursos
não podem ser liberados.
Ao ser questionado sobre a investigação pedida pelo grupo, o
secretário de Transportes de São Paulo, Saulo de Abreu, minimizou o caso.
"Alguns moradores não estão muito contentes com a obra. Se fosse tudo no
meio de uma fazenda, não teria problema. No meio da cidade, toda obra gera
problema. De qualquer forma, está tudo certinho com o BID. O dinheiro vai sair
na medida do desembolso", diz.
Laurence Casagrande Lourenço, presidente da Desenvolvimento
Rodoviário S.A (Dersa), estatal responsável pela obra, é mais cuidadoso.
"De fato, um processo foi aberto no BID e está em análise. Mas, da mesma
forma que recebe as denúncias do Mauro Victor, me consultam para saber o que
está acontecendo. Até agora, tivemos êxito", afirma.
"Nas três missões do banco ao Brasil, fomos para a fase
seguinte. Por isso, não temos motivos para acreditar que o dinheiro não vai
sair". Ainda segundo o presidente da Dersa, a expectativa é assinar o
primeiro dos dois contratos até dezembro.
"Mas, desde abril deste ano, temos autorização do banco
para gastar. Os cofres do governo serão ressarcidos quando sair o
financiamento. O grupo do Mauro Victor é pequeno, mas muito organizado. Talvez
o banco tenha um pouco mais de cuidado antes de conceder o financiamento, seja
mais conservador, como um bom banco deve ser".
O escritório do BID no Brasil confirmou a instalação da
investigação sobre as denúncias em Washington. Até o fechamento desta edição, a
assessoria técnica do banco não havia respondido se o rito de averiguação pode
travar o envio dos recursos. No site da instituição, o projeto do Rodoanel
aparece como "em preparação" e não como "aprovado".